quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Homenagens 21(ICD)

Então ...Aí  chega  novembro... E já começa a se ouvir das comemorações da Semana da Consciência Negra, que agora é lei, aqui em JF. Ainda é pouco diante do longo esquecimento e da exclusão por mais de um século... Quando eu era criança, os familiares adultos usavam a figura de uma parenta para assombrar as crianças: ─ Olha que a  Nêga Véia te pega! Minha mãe tinha mágoa dela e a chamava de nêga preta . Na busca da minha consciência étnica, fui aos poucos descobrindo quem ela era de fato e o que eu herdara dela... Então escrevi e reescrevo agora. Ela?


A minha bisavó materna
 Aquela  negra  era preta! Pretinha mermo! Nêga preta bonita e magricela! 
Mas não dera pra mucama,posto que rasgara o vestido de saco, 
com peito de renda, que a dona da fazenda lhe fizera.
Aquela negra era preta e abusada!
A nêga preta fazia o que negra não podia,dizia o que escrava não dizia 
e a sinhá não queria e sabia o que mulher não sabia... 
E se arguém ralhava, ela ria um riso tonto,doído: 
A nêga preta ria um riso doido, um riso rido mermo
Aquela negra preta  era fujona! 
A nêga preta fugia pelas pinguelas,saias amarradas na cintura, 
coxas pretas mermo à mostra ...livres! 
Não havia quem lhe apanhasse... e se argum se assanhasse: 
Tira os óios, branco safado... que não lhe dei confiança! 
Nas ancas, leva a criança e no coração, a esperança!
 E a nêga preta mermo,abusada mermo...
A nêga preta fujona mermo... vadeava o rio... vadeava a vida... 
vadeava a vida... vadeava o rio!... 
E vadeando... vadeando... lá ia aquela  negra  velha preta, 
abusada e fujona mermo, escapando das sombras escravas da morte,
 entre as sombras escravas da estrada... a caminho do sol, para mudar a sua sorte,
querendo ser um raio de muita  luz!... querendo ser o que era mermo: 
a nêga preta véia livre Maria da Cruz!!!

 Izabel Cristina Dutra, reescrito em JF, 10/11/2011.