segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Revisitando a poesia...

As tragédias  anunciadas vão se repetindo e, muitos vão se acostumando... Todavia, mais do que nunca, é preciso registrar nossa indignação e lutar pra mudar  essa história... Por isso, indignada, reescrevi outra vez e outra vez reescrevi e, coloquei as estrofes em  ordem cronológica:

Aos meus, aos teus, aos seus, aos vossos, aos nossos...
(de todos os tempos...)


Ai d'ocês, sobrinhos e parentes de Brumadinho...
dos pés de feijão do seu tio...
só sinto o gosto de um caldo estranho escorrendo...
laah... na  feijoada da minha tia enlutada...

Ai de vous*, citoyens de Paris*...
de vossos lenços perfumados  esfarrapados, pelas bombas,
só sinto o cheiro ardido da intolerância e da morte,
laah.. no meu toaleteh...

Ai d’ocês, gentes de Bento Rodrigues e de Mariana...
de seus brotinhos tenros, afogados pela lama,
só sinto a essência das tragédias anunciadas,
laah... no meu jardim autorizadoh...

Ai de ti, Noiva de Sampa …
de teus  sonhos brancos soterrados, pelo morro,
só desfio  uns farrapos de véu agarrados,
laah na minha cortinah  ...

Ai de ti, Gato da China  ...
de teus pelos e ossos escondidos, pelos escombros,
só vejo a ponta de um rabo cheirando a mofo,
laah... no meu tapeteh ...

Ai de ti, Moço do Sul ...
de teus lucros verdes arrancados, pelas águas,
só sorvo o vinho amargo misturado ao lodo,
laah... na minha panelah …


Ai de ti, pedreiro de Barreiro...
de teus piso lisos misturados ao lixo pela enxurrada,
só me espeto  em cacos misturados  ao pranto,
laah... na minha salah …

Ai de ti, Cão de Machu Pitchu ...
de teus uivos  agoniados, ecoando pelas cordilheiras,
só ouço uns  ganidos de um cachorrinho,
laah... no meu vizinho ...

Ai de ti,Vovó de Friburgo...
de teus cabelos ensopados ao vento serrano,
só  afago  um fio de prata ensanguentado e encaracolado,
laah... na minha toalhah...

Ai de ti, Mestre do Japão...
de  tuas cerejeiras carregadas  e desencantadas,
só arranjo  flores murchas e radioativadas,
laah... na minha jarrah...

Ai de nós, Mães do Realengo...
de nossas menininhas mortas com cachos definidos,
só desfaço  um laço de cetim e sangue,
aki...  no meu penteadoh...

Ai de ti, Mãe do Haiti …
de  teu amores já  trincados, pelo próximo tremor,
só recolho uns restos de  coração palpitando,
laah... na minha janelah…

Ai de ti, Girl* de Nova York...
dos teus  saltos firmes  com  tuas botas estraçalhadas,
só caminho uns passinhos trêmulos,
laaah..na minha calçadah...

Ai de mim...
mesmo que eu tente segurar a mão que atira,
mesmo que eu tente escorar o muro que desaba,
mesmo que eu tente  impedir tudo aquilo que bate, destrói e mata...
e ...mesmo que eu tenha doado toda a minha alma,
que vai entulhada nestes caminhões de coisas  doadas,
mesmo que eu chore todo o choro que se tem chorado,
mesmo que eu cante todo canção de indignação,
que se tem cantado,
não chego a tempo de vos  livraar...
Só de gritaaar...
Ai dos meus... Ai dos teus... Ai dos vossos... Ai dos nossos!!!...

Então... 
Eu tento em meio a todas essas lamas,a todos esses cacos,
a todos esses frangalhos,
a todos esses tiros e socos,
    a todo esse suor  e lágrima ...
a toda essa dor infindah...
resgatar um pouco de Fé e Poesia,
e clamar a Deus, para nos guardar
para que possamos eu, tu , eles, nós
– que aqui ficamos –
devagarzinho nos consolar
e nos fortificar,
para que possamos recomeçar 
e nunca parar de lutar
para mudaaaarrr!!!...

Izabel Cristina Dutra, reescrito em
JF/MG,  no dia 16/03/2019

*  vous- vós; citoyens - cidadãos, girl - garota.



As tragédias vão se repetindo e muitos vão se acostumando mas mais do  que nunca preciso registrar nossa indignação:  

Aos teus, aos meus, aos nossos...
Ai de ti, Mãe do Haiti …
do teu amor já  trincado, pelo próximo tremor,
só recolho uns restos de  coração palpitando,
lá na minha janela…
Ai de ti, Noiva de Sampa …
dos teus  sonhos brancos soterrados, pelo morro,
só desfio  uns farrapos de véu agarrados,
lá na minha cortina  ...
Ai de ti, Gato da China  ...
dos teus pelos escondidos, pelos escombros,
só vejo a ponta de um rabo cheirando a mofo,
lá no meu tapete ...
Ai de ti, Moço do Sul ...
dos teus lucros verdes arrancados, pelas águas,
só sorvo o vinho amargo misturado ao lodo,
lá na minha panela …
Ai de ti, pedreiro de Barreiro ...
do teu piso liso misturado ao lixo, pela enxurrada
só me espeto  em cacos misturados  ao pranto,
lá na minha sala …
Ai de ti, Cão de Machu Pitchu ...
dos teus uivos ecoando, pelas cordilheiras,
só ouço os ganidos de um cachorrinho,
lá no meu vizinho ...
Ai de ti,Vovó de Friburgo...
dos teus cabelos ensopados ao vento serrano,
só  afago  um fio de prata encaracolado,
lá na minha toalha...
Ai de ti, Mestre do Japão...
de  tuas cerejeiras carregadas  e encantadas,
só arranjo  flores murchas e radioativadas,
lá na minha jarra...
Ai de nós, Mães do Realengo...
de nossas menininhas de cachos definidos,
só desfaço  um laço de cetim e sangue,
aqui no meu penteado...
Ai de mim...
mesmo que eu tenha doado toda a minha alma,
que vai entulhada nestes caminhões de coisas doadas,
mesmo que eu chore todo o choro que se tem chorado,
não chego a tempo te livrar...
Então tento em meio a toda essa lama,
em meio a todo este sangue,
resgatar um pouco de Fé e Poesia,
e clamar a Deus, para nos guardar
e que possamos eu, tu , eles, nós
– que aqui ficamos – 
devagarzinho nos consolar
e nos fortificar,
para que possamos recomeçar 
e nunca parar de lutar!

Izabel Cristina Dutra. reescrito  em JF/MG em 2011.